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Auditores Públicos Externos encontram irregularidades nas obras da Copa

Relatórios do TCE revelam inconsistências nos primeiros projetos das obras da Copa em Porto Alegre. Estudos insuficientes do solo e readequações terminaram em aditivos nos contratos e atrasos

Escrito por Zero Hora, publicado no dia 14/06/201515 de Jun de 2015 às 14:33
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Técnicos do TCE analisaram os projetos básicos das obras da Copa.
 
 

PROBLEMAS BÁSICOS

Falhas em parte dos projetos básicos elaborados pelo convênio entre a prefeitura de Porto Alegre e o Ciergs geraram aditivos e readequações a um custo de, pelo menos, R$ 9 milhões. Isso porque os orçamentos iniciais estavam subavaliados, o que pode ter ocorrido por imperícia técnica ou intencionalmente.

Como agravante, há a participação do mesmo engenheiro em projetos básicos e executivos em quatro obras – algo vetado pelo próprio convênio entre o Executivo e o Ciergs e pela Lei de Licitações. Alguns dos alertas feitos por técnicos do TCE que analisaram os projetos básicos das obras da Copa se confirmaram nos projetos executivos. Foram assinados termos aditivos relacionados a falhas no planejamento inicial nas quatro obras em que o engenheiro Martin Alfredo Beier, da Deltacon Engenharia, aparece como autor dos projetos básico e executivo. Entre as deficiências encontradas, estão métodos construtivos incompatíveis e estudos geológicos incompletos, que elevaram os custos de materiais e pessoal previstos inicialmente.

Quando o crescimento da quantidade de materiais se soma a composições incorretas de preços e serviços usados para o orçamento, as distorções no custo final de uma obra são ainda mais gritantes. No viaduto da Bento Gonçalves, por exemplo, um aditivo acrescentou R$ 3.730.227,05 ao custo total, sendo R$ 2.617.407,7 relativos ao aumento de 50% na quantidade de um tipo de estacas. Para justificar, foram usadas as novas sondagens do projeto executivo, o que demonstra que o planejamento inicial não investigou o solo corretamente. Algo muito parecido ocorreu no Viaduto Abdias do Nascimento, que liga a Rua Pinheiro Borda à Avenida Edvaldo Pereira Paiva. Uma mudança de cálculo na quantidade e no comprimento de estacas necessárias após nova investigação geológica culminou em um termo aditivo de R$ 2.234.927,02.

O estudo do solo também era incompleto em outros projetos realizados pelo engenheiro Martin Beier. Reportagem de ZH de 9 de abril mostrou que foram feitos apenas dois furos de sondagem na obra da trincheira da Rua Anita Garibaldi, enquanto o detalhamento executivo realizou 23. A investigação insuficiente do solo ocultou algo que não escaparia até mesmo de estudantes da área: uma enorme rocha, que aumentou o custo da obra em cerca de R$ 4 milhões.

Na passagem de nível da Avenida Ceará, um estudo geotécnico realizado na fase de projeto executivo apontou deficiências na proposta inicial. O solo, na verdade, era instável, o que poderia afetar as fundações de prédios vizinhos e do Viaduto Leonel Brizola. Resultado? Termo aditivo assinado.

Engenheiro nega erros técnicos

O engenheiro Martin Beier é enfático ao afirmar que seus projetos básicos eram suficientes e até superiores aos apresentados normalmente para obras públicas semelhantes:

– A engenharia tem uma imponderabilidade. Não sou aventureiro na área, tenho a consciência tranquila.

Sobre ter participado de projetos básicos e executivos (na verdade, os projetos executivos foram assinados pelo filho, Marcos Beier, que tem outra empresa no mesmo endereço da Deltacon), ele diz que “é algo que sempre dá encrenca na nossa área (engenharia)”. Os trabalhos para as cinco obras foram feitos durante seis meses, segundo Beier, que não considera os estudos geológicos insuficientes.

– Algumas não tinham tempo hábil para mais sondagens. As sondagens foram feitas dentro do padrão do menor custo, do mínimo necessário – explica.

Após solicitação do TCE, uma câmara especializada do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia (Crea-RS) vai analisar a atuação de Beier, que já apresentou defesa, baseada no conceito de direito autoral dos projetos, em que a mudança de projetista na fase de execução poderia “mudar o DNA da obra”. Para ele, o problema nas obras da Copa na Capital são de gestão, mas que “acabam estourando no elo mais fraco, que é o projetista”. Perguntado se teria sido responsável por algum aditivo irregular, ele preferiu se eximir e apontar para as empresas responsáveis por tocar as obras:

– Se tu me perguntares por aditivos, tem coisas exageradas, mas por causa das construtoras. Eles são comerciantes e, se a porteira está aberta, tocam ficha.

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NOITES CARAS DEMAIS

Serviço de sinaização noturna de 12 obras dos 14 projetos analisados pelo TCE apresentou sobrepreço

O esquadrinhamento feito pelo TCE identificou um mesmo problema em nada menos do que 12 das obras analisadas. Os técnicos da corte verificaram um risco de prejuízo global de pelo menos R$ 3,9 milhões aos cofres públicos decorrente de sobrepreços na contratação de serviços de sinalização noturna – o aluguel de balizas luminosas ou refletivas e de carros-seta destinados a apontar a existência de obras e eventuais desvios viários à noite.

Uma das principais razões para o apontamento do TCE foi a disparidade verificada entre os preços pelos quais a prefeitura aceitou alugar o carro-seta e as balizas e os valores de mercado para esses serviços. Ao comparar os valores contratados para obras do Mundial com aqueles pagos pela própria prefeitura para reformar o Túnel da Conceição, no mesmo período em que foram elaborados os orçamentos para a Copa, o Tribunal verificou que o valor pago pelo carro-seta estava 100% maior. O aumento de preço no item “baliza refletiva” chegou a 359%.

Enquanto um carro-seta (espécie de painel com seta luminosa) para sinalizar obras da Copa estava orçado com um custo mensal de R$ 3,9 mil por unidade, o mesmo item saiu por R$ 1,95 mil ao mês para a reforma do túnel. A discrepância era ainda maior em relação às balizas refletivas – o aluguel mensal de cada uma saltou de R$ 29,52 para R$ 136,50. Como o preço excessivo foi praticado em várias licitações, a soma dos valores considerados abusivos pelo TCE em todos os processos analisados por ZH chega aos R$ 3,9 milhões.

O secretário municipal de Gestão, Urbano Schmitt, argumenta que as contratações foram feitas levando em consideração uma tabela elaborada pela Empresa Pública de Transporte e Circulação (EPTC), à época, com base no mercado. Esse valor, acrescido de 30% a título de Benefícios e Despesas Indiretas (acréscimo previsto em contratos que prevê o lucro e gastos da empresa contratada com tributos e administração), alcançava os valores finais orçados.

– Esse foi o valor apresentado na tabela pela EPTC, depois de pesquisar o mercado levando em consideração padrões mínimos de qualidade – afirma Schmitt.

Tabela deixou de ser divulgada pela EPTC

O Tribunal sustenta que os itens flagrados com sobrepreço foram pesquisados em apenas uma empresa, chamada Balizasul – o que seria insuficiente para uma correta avaliação do mercado. Os valores excessivos eram pagos para as construtoras licitadas para fazer as obras, que subcontratavam as fornecedoras de sinalização. O Tribunal apurou, porém, que os preços pagos às empresas de sinalização eram inferiores ao inicialmente orçado e correspondiam à média do mercado. A diferença ficaria com as empreiteiras.

Após as manifestações do Tribunal, com a concordância da prefeitura, os pagamentos às empresas foram reduzidos para eliminar os sobrepreços. ZH procurou o responsável pela empresa Balizasul, identificado pelo registro na Receita Federal como Armando Eugênio Salvador, na segunda-feira passada, para explicar a razão do elevado preço fornecido para nortear a tabela da EPTC em 2011. Por celular, Salvador argumentou que não poderia falar no momento devido a um problema de saúde de sua mulher e pediu que a ligação fosse refeita outro dia. Na quinta-feira, ZH voltou a procurá-lo. Um homem identificado como seu filho atendeu a ligação e disse que o empresário não se encontrava. Em novos telefonemas, não atendeu e não retornou as ligações.

O diretor-presidente da EPTC, Vanderlei Cappellari, afirma que a tabela feita pela entidade tinha como objetivo servir como referência de preço máximo, e deixou de ser publicada depois de determinação do Tribunal:

– A tabela de 2011 tinha apenas alguns preços com menos fornecedores. Inclusive explicitamos quando havia um único produto de uma determinada linha. A ideia era apresentar valores mínimos, médios e máximos. Depois disso, houve uma redução nos preços praticados no mercado porque mais empresas entraram nele.

 

   

 

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